Sunday, January 7, 2007

scanning theory 3

A quite absolute closeness. We cannot scan landscapes.

O chiaroscuro é òrfico?

Há cinco tipos de espaços que se entremisturam quer antagónicamente, quer em transições e modulações –

1) O espaço da colagem, modernista, herdado do cubo-futurismo, essêncialmente fractal, feito de explosões onde o objecto surge como ironia de desfeitas fenomenologias.

2) Um espaço onde a côr plana é possível e se pode hiperrealizar e assumir a intensidade da superfície (na tradição das iluminuras moçárabes até Peter Haley, passando por Matisse).

3) Um espaço de profundidade relativa que procura virtualizar-se em devaneios, como o da tradição do trompe-l’oeil.

4) Um espaço que herda o claro-escuro dos dispositivos òpticos, num registo claramente caravaggesco e em que a profundidade dos objectos os torna densos e os anamorfisa. Este tipo de espaço é tecnológicamente barroco e nele se dá uma ovulização (elipse tridimensional).

5) Há ainda a possibilidade de alguma transparência e de sobreposição graças à intensidade da luz. Este é um espaço de acumulação, como no paleolítico e nos palimpsestos.




A próximidade do plano do scanner apróxima-o da pintura. Trata-se de situar tudo nesse «quase» plano e de inventar, através de vários recursos retóricos a profundidade – o trompe-l’oeil e a já velha colagem herdada do cubo-futurismo encenam virtualidades com recurso à reprodução. No trompe-l’oeil simula-se um espaço representando-o como engodo. As anedotas da antiguidade registadas por Plinio, ou as fábulas chinesas em que o pintor entra na obra, registam esse desejo de ficção mais forte que as aparências. Não se trata de um combate com a realidade ou de uma primazia de representação, mas de demonstrar a força de persuasão contra a moleza das aparências.

Na colagem é um mundo em explosão que regista as suas co-agitações, entre a excitação que oferece um certo nominalismo do aleatório (o aleatório nunca é platónico) com o fantasma da informalidade como plano de fundo, e a inevitabildade da disposição das coisas no espaço, com toda a treta composicional a que não podemos, por tradição (ou não?) escapar. A história da colagem, desde os seus primórdios, oferece o contraponto entre o objecto, como identidade matérica e sujeito às cambiantes volumétricas de cada luz que lhe incide, e o prazer de abusar da reprodução plana – quer de palavras, quer de imagens filtradas mecânicamente (com apogeu na pop art). De Picasso aos dadaístas, das caixas de Duchamp e Cornell e às pinturas enormes dos popistas, com ou sem objectos colados (penso tambem em Souza-Cardoso).




Podemos optar em assumir o plano plenamente, com uma côr que o radicaliza (e que se torna substancial se a reproduzirmos como se fosse serigráfica) ou contrariá-lo em precisiostas claro-escuros (e que parodia quer os esfumados do desenho a carvão, quer a dureza das gravuras quinhentistas). É inevitável pensar em Caravaggio, como uma velocidade exímia (e de rapina) de registo de algo preciso que exibe o seu pathos como algo que se mascara de um dei profundis (o seu âmago é no entanto carnavalesco e adolescente) – podemos recorrer a Gombrowicsz para perceber o Barroco como desejo de regressar à imaturidade na maturidade ou procurar entendê-lo melhor segundo uma lógica de «honesta dissimulação», como teorizou Torquato Acceto, entre outros – ao contrário de Braudillard, não se trata de deixar ser vítima fatal da violência dos simulacros ou de encenar estratégias, mas de descerrar uma púdica franqueza no larvato prodeus. Não percebemos se são os adolescentes do primeiro Caravaggio que anunciam as rugas e as feridas do último – mas trata-se de entender o caracter irredutor e não-redentor do tempo. Os teóricos podem falar da dobra (Deleuze), do tímpano (Derrida), do punctum (Barthes), ou de algo auricular.



A lógica do claro-escuro, que foi a da fotografia a preto-e-branco é quase sempre a da estética barroca. Daí a enfase no nú femenino como modulação de semi-tons no arredondado. Mas é também uma razão pela qual o claro-escuro, que é o modo de visão que os olhos adoptam na noite, convida à musicalidade. Estamos num sistema oposto à exterioridade difusa e cromática dos impressionistas.

A côr tem uma lógica fisiológica distinta do claro-escuro, que nos oferece as ilusões volumétricas e velozes, através dos bastonetes. «Os bastonetes vêem bem quando já pouca luz e “enxergam” tons de cinza. Os cones só funcionam bem na claridade, mas reagem com rapidez e “enxergam” detalhes e cores.». «Só temos visão exacta das cores quando olhamos diretamente para um objeto e a imagem incide na fóvea». A côr é meditativa. Pede «naturalmente» a nossa atenção e deleitanos com uma intensa e excitante quietude. A côr atira-nos para o caminho do extase.

Há uma diferença de tempo e de espaço essêncial relativamente à fotografia. O scanner varre o espaço não de um único ponto de vista, mas como uma onda que arrasta e varre multiplos pontos de vista. O scanner «deforma» diferentemente. Anamorfisa, elipsa, ovulisa.
O tempo é distinto do da fotografia, se bem que haja fotografias que também possam demorar bastante tempo. No caso do «retrato» dos scanners actuais, o retratado tem que estar demasiado quieto, como numa radiografia, sem respirar.

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